As colunas [sem surround]

12.08.2005

# 17

Cocteau Twins, Treasure [4AD, 1984]

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Ivo / Lorelei / Beatrix / Persephone / Pandora [For Cindy] / Amelia / Aloysius / Cicely / Otterley / Donimo

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Nunca um disco foi tão bem baptizado. Treasure é, ainda hoje, um verdadeiro tesouro musical. Um tesouro belo e hipnótico. Os Cocteau Twins formaram-se em Grangemouth na Escócia [em 1980] e viriam a tornar-se num dos mais encantadores projectos musicais dos anos 80. Robin Guthrie, Simon Raymonde [que substituiu o elemento original Will Heggie] e Elizabeth Fraser gravaram este disco no período de maior criatividade da banda [que vai de 84 a 86]. Treasure vive essencialmente das guitarras planantes de Guthrie e, especialmente, da voz de Liz Fraser. Aquela espantosa voz! Em Treasure, como em outros trabalhos, as palavras cantadas por Liz são praticamente indecifráveis mas a intensidade do seu canto é tão poderosa que nos prende e enleia do primeiro ao último instante.
Recordo-me perfeitamente da primeira vez que ouvi os Cocteau Twins. Foi, só podia ter sido, no Som da Frente de António Sérgio quando saiu o EP Aikea-Guinea em 1985 e a rendição foi imediata. Só depois descobri Treasure. Depois os Cocteau Twins ainda compuseram mais uma obra prima em formato de álbum [Victorialand] e conseguiram um bom disco com Blue Bell Knoll, mas a partir daí jamais conseguiram recapturar o toque mágico do período compreendido entre 84 e 86.
Etéreo era um dos adjectivos que se costumavam "colar" à música dos Cocteaus Twins. Eu sempre prefiri hipnótica.

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Em 1984, ano da edição de Treasure, Portugal era um país triste, com salários em atraso e falava-se de fome no distrito de Setúbal. Os milhões da então CEE só começariam a jorrar alguns anos depois e a A1 ainda não ligava Lisboa ao Porto. Musicalmente, vivia-se a ressaca do "rock português" e estávamos ainda longe da rota das digressões internacionais. À generalidade das lojas de discos não chegava o que de melhor se fazia lá fora e o que chegava, por via da importação directa, atingia preços incomportáveis para o cidadão médio. Na rádio, venerava-se com naturalidade António Sérgio e o seu Som da Frente [fonte inesgotável de temas para gravações caseiras - sei de quem gravou dezenas e dezenas de programas nas velhinhas cassetes]. Industria musical era coisa que não havia por cá. Os Xutos & Pontapés, por exemplo, eram um grupo de culto restrito e só conseguiam nesse ano editar um single [excelente, aliás: Remar Remar / Longa Se Torna A Espera] na Fundação Atlântica [de Miguel Esteves Cardoso e Pedro Ayres de Magalhães, entre outros].